quarta-feira, 3 de agosto de 2016

Dehon e Harmel

Há precisamente 100 anos

Pe. Leão Dehon = Le Très Bon Pére = O Padre Muito Bom
Leão Harmel = Le Bon Pére = O Bom Pai




















1) DOIS LEÕES AMIGOS
Agosto de 1916 - Leão Harmel - Tomei conhecimento da morte do Sr. Harmel e Mr. Paul Hennezel. O Sr. Harmel teve um grande papel no movimento das obras católicas. Sinto-me feliz por ter partilhado os seus pontos de vista e por fazer parte dos amigos do Sr. Harmel, o Sr. De Mun, o Sr. Vrau e de muitos outros que os imitavam e trabalharam com eles. Agora estão no céu, eles vão pedir a graça para mim. A Ação Social Católica e o reino do Coração de Jesus foram duas grandes missões nas quais a Providência me atribuiu um papel que com muitas falhas cumpri.
Sr. Harmel morreu na altura do colapso da sua fábrica, da morte de muitos dos seus e das angústias patrióticas. Ele oferecia-se cada dia como vítima para a regeneração cristã do povo. Ele morreu como vítima de reparação e salvação” (NQ 1916).

O Pe. Dehon e Leão Harmel encontraram-se pela primeira vez no Congresso dos Círculos Católicos, realizado em Nantes, de 25 a 29 de agosto de 1873.
A partir daí foi crescendo uma amizade pessoal e uma colaboração ministerial até ao falecimento do empresário em Nice a 25 de novembro de 1915, apesar do Pe. Dehon só ter tido conhecimento em agosto do ano seguinte, porque estava no centro e em plena guerra mundial. Tinha nascido a 17 de fevereiro de 1829.
A 4 de junho de 187 o Pe. Dehon assinala no seu diário: Carta de Val-des-Bois. Projeto de aceitar a capelania e de fundar lá na fábrica uma escola vocacional (NQ III, 106-107).
O primeiro sacerdote destinado a essa capelania parece ter sido o Pe. Herr.
Anota mais tarde no seu diário a 6 de julho de 1887: Partida do Pe. Charcosset para Val-des-Bois. Esperoa desta fundação muitas vantagens para o desenvolvimento da Obra (NQ III, 108).
O Pe. Charcosset permanecerá lá até à sua morte (1912) Com ele estiveram outros confrades. O Sucessor foi o seu sobrinho Pe. José Lázaro Gallard, de 1904 a 1952.





















2) DOIS APÓSTOLOS SOCIAIS
Em 1897 o Pe. Dehon foi recebido juntamente com Leão Harmel em audiência pelo Papa Leão XII. Fazia parte da comitiva o Pe. Júlio, franciscano e o sr. Palomera, um empresário de Cognac. Desta audiência o Pe. Dehon escreve no seu diário (NQ XII 22/01/1897).
Mal me viu, o Santo Padre disse-me:
- Faz conferências em Roma, já começou?
- Sim… faço uma de quinze a quinze dias.
E o Papa acrescentou:
- Sobre a questão social?
- Sim, santo Padre.
- Muito bem!
Leão Harmel falou-lhe então das obras sociais. O Pe. Dehon da Congregação… E o Santo Padre:
- Fazei o apostolado popular, ensinai os direitos de ada um, dos patrões, dos operários. Desviai o povo do socialismo…
Leão Harmel disse ao Papa:
- Santo Padre, o movimento democrático cristão, na linha das vossas encíclicas, faz progressos em França. Tem as suas revistas, como La Démocratie Chrétienne de Lille, os seus jornais, La France libre, L’Úniverse etc.
O Santo Padre acrescentou:
- E Le Peuple Français.
- Tem também os seus congressos, que são muito vivos.
O Santo Padre voltou-se então para mim e disse-me:
- Esteve no Congresso de Lião, não é verdade?
- Sim, Santo Padre – respondi – e tudo correu muito bem. Foram muito aplaudidos os ensinamentos pontifícios.
- E o Arcebispo, Mons. Couillé, ficou um pouco assustado. Não é verdade?
- Sim, - retomou Leão Harmel – porque em Lião há fortes influências refratárias...
Leão Harmel mencionou então a atividade dos padres que se dedicavam ao povo como o Pe. Dehon, Lemire, Gayraud, Garnier, Naudet…
O Santo Padre disse-nos:
- Precisa uma organização e líderes para a ação política e social. Para a atividade social, temos Harmel. Para a atividade política, pensais que o M. Lamy poderá conseguir?...
Saímos muito emocionados e verdadeiramente satisfeitos, depois de 35 minutos de audiência.














3) DOIS ESCRITORES
Com a morte de Leão XIII (20 de julho de 1903) o apostolado social do Pe. Dehon, na sua forma mais ativa, termina.
São oito os seus livros publicados sobre o a Doutrina Social da Igreja:
- Manual Social Cristão (l894)
- A Usura no Nosso Tempo (l895)
- Diretrizes Político-Sociais do Papa (l897)
- Os Nossos Congressos Sociais (l897)
- Catecismo Social (l898)
- Riqueza, Bem-Estar e Pobreza (l899)
- A Renovação Social Cristã (l900)
- O Plano da Maçonaria ou seja a Chave da História dos últimos Quarenta Anos (1908) 

Leão Harmel continuou a sua ação de apóstolo social nas suas fábricas.
São também oito os seus principais livros sobre a ação social da Igreja:
- Organização cristã da fábrica (1874)
- Manual de uma corporação cristã (1877)
- Conferência ao Círculo Católico de Seez (1881)
- Catecismo do Patrão (1889)
- Democracia cristã, discurso de Tours (1997)
- O Apostolado operário (1898)
- Viagem a Roma (1899)
- Reunião geral de férias (1911)















4) TESTAMENTO DO BON PÉRE
O célebre industrial do  Val-des-Bois, Jacques-Joseph, pai de Leão Harmel, cristão excelente a quem os operários chamavam: "O bom pai", e que sempre procurava uma perfeita união com os seus operários quis, antes de morrer, deixar aos filhos o testamento seguinte:
Testamento de um chefe de família – Le Bon Pére
 “Meus bons filhos, quando lerdes estas linhas já eu não estarei vivo. Já a morte me terá feito comparecer diante do supremo juiz. Que Ele se digne continuar a prodigalizar-me nesse momento terrível a misericordiosa bondade que me dispensou em todos os instantes da minha vida.
Não vos deixo órfãos; encarrego-vos à melhor e à mais poderosa das mães. Todos sois filhos de Maria, lembrai-vos disso. Foi o primeiro nome que recebestes todos no batismo. Quisemos assim consagrar-vos a essa Mãe por excelência. Não vos abandonará se A invocardes sempre. Amai-A; por meio d’Ela amareis a Jesus.
Toda a lei se resume numa só palavra: amor! Amai-vos uns aos outros; seja a caridade a vossa regra absoluta!
Dai, e Deus vos restituirá, mesmo neste mundo. A caridade não arruína ninguém, e não vos contenteis com dar dinheiro, dai-vos a vós mesmos.
Evitai o luxo. Além de arruinar as famílias, o luxo seca a alma.
Suportai pacientemente os contratempos, as injúrias; são outras tantas pérolas que o bom Mestre vos envia.
Procurem os meus filhos religiosos ser melhores, porque, no caminho de Deus, ou avançamos ou recuamos. Não podemos estacionar. Mas os que vivem no mundo, não se julguem dispensados de coisa alguma. Também para eles há um céu a ganhar e um inferno a evitar. O caminho do céu é estreito e áspero. É mais difícil para eles do que para os religiosos.
Organizai para vós algum regulamento de vida simples, não muito carregado, mas procurando a sério ser-lhe fiéis.
Meditai todos os dias, nem que seja pelo espaço de um quarto de hora apenas. Será o tempo mais bem empregado do dia. Santa Teresa diz que se responsabiliza pela salvação de quem medita todos os dias.
Finalmente, mortificai-vos, imponde-vos alguns sacrifícios de vez em quando. Tendes tanto que pagar e a vida é tão curta!
Não me esqueçais depois da morte; não esqueçais a vossa mãe quando ela vier juntar-se a mim. Diante de Deus lembrai-vos algumas vezes daqueles que tanto vos amaram na terra e continuarão a amar-vos no céu…”
(cf. Raul Plus, Cristo no lar, meditações para pessoas casadas, Apostolado da Imprensa, 1947)

5. MENSAGEM FINAL
Quando Leão Harmel foi alvo de críticas sobre o seu espírito social católico, o Pe. Dehon ficou ao seu lado para o animar, dizendo:
- Não percamos tempo a responder a mortos. Voltemo-nos para a vida.
(cf. G. Guitton, León Harmel, II, 23)


2 comentários:

PPerrein disse...

Boa noite, sou descendente de Léon Harmel e leio seu texto com muito interesse.
Eu tenho uma pergunta: eu não encontrei nos livros de G.Guitton a frase que você cita em sua Mensagem Final: você pode me dizer em qual capítulo ela é?
Tenho uma observação: o testamento que você cita não é o de Léon Harmel, mas de seu pai Jacques-Joseph, que também era chamado de Bom Pai.
Sinceramente

Quintal Vieira disse...

Estou muito feliz por contactar com descendente de Léon Harmel.
Obrigado pelas observações pertinentes. Já corrigi.

Quanto à citação no final do texto - usei a informação do livro de Giuseppe Manzoni, Leone Dehon e il suo messaggio, Edizioni Dehoniane Bologna.1989
Na página 360 faz a citação (nota 39) - G. GUITTON SJ, Léon Harmel, II, 23.

Na bibliografia dessa obra consta: Guitton Georges sj, Léon Harmel 1829-1915. I - Jusqu'á l'encyckique Rerum novarum, éd. Spes, Paris 1927. II - Aprés l'encyclique Rerum novarum, Éd. Spes, Paris 1933.