terça-feira, 1 de junho de 2010

A Excelência do Pai-nosso

Durante este mês, dedicado ao Coração de Jesus, procurarei partilhar algumas páginas com versões da oração do Pai-nosso. A apresentação seguirá uma ordem alfabética do seu título.

Foi num retiro de jovens da Madeira, que partilhei pela primeira vez uma colectânea de Pai-nossos.
As Edições Paulinas publicaram em 1990, com o título O PAI NOSSO DE CADA DIA, integrada na Colecção Celebrar essas variadas glosas ao Pai-nosso. Algumas delas foram adaptadas ou livremente inspiradas em diversos autores. A ordem dos textos foi ditada alfabeticamente pelos títulos.
Ao longo dos séculos os cristãos têm descoberto no Pai-nosso, tudo o que sonharam rezar a Deus e nunca se cansaram de aprofundá-lo cada vez mais, qual tesouro inesgotável. Esta foi a primeira oração que aprendemos e aquela que mais vezes é recitada, pessoal e comunitariamente. Podemos, no entanto, rezá-la sempre com toda a novidade. Só aquele que permite que a sua vida fique condicionada pelas palavras de Jesus poderá compreender a sua oração.
O Pai-nosso é um guia de oração. Não só quer dar directivas quanto ao conteúdo, mas também uma introdução formal e uma ajuda. Salvaguardando as leis da sua forma e do seu conteúdo, pode variar e ser construído desta ou daquela maneira. Então toda a oração deve brotar do Pai-nosso.


O PAI NOSSO DE CADA DIA (1)

As primeiras quatro palavras, Pai-nosso que estais nos Céus, nos ensinam que, na oração, estão implícitas quatro coisas, a saber, fé, esperança, caridade e humildade.
Vem a caridade significada logo nas primeiras palavras, porque, por natureza, qualquer criatura ama o seu pai carnal, de quem somente recebeu o corpo. Ora, muito mais deves tu amar a Deus Pai que te deu o ser do corpo e da alma, te remiu estando tu perdido, te suporta quando pecas e te perdoa quando a ele tornas, prometendo-te a glória e dando-te, neste mundo, todas as coisas necessárias. Por isso o tens de amar acima de todas as coisas. Mostra-nos Deus esperança, por aquela parte que diz: nosso. Se é nosso pai, com razão devemos dele esperar todo o bem, deste mundo e do outro, fazendo nós a sua vontade. Mostra-nos também a firme crença que devemos ter, pois ao dizermos que estais, cremos que Deus existe e tal fé muito lhe apraz, pois sem ela não poderia Deus ser conhecido nem honrado. Mostra ainda a verdadeira humildade que devemos ter, perante ele, através as palavras nos Céus, porque, quando pensamos estar ele nos altos Céus e nós aqui em baixo, na Terra, então nos humilhamos, conhecendo que è Nosso Senhor poderoso e infinito e nós seus servos inúteis, fracos e pequenos.
Obtidas estas quatro coisas (a saber, fé, esperança, caridade e humildade), então podemos confiadamente rogar e dizer com toda a afeição: Santificado seja o vosso nome. Senhor e Pai, que o vosso nome de tal forma seja confirmado em nós, vossos filhos, que façamos a vossa vontade e contra ela nada obremos.
E por não podermos fazer isto perfeitamente neste mundo, dizemos: Venha a nós o vosso reino. Isto é, que estejamos em vós, ó Pai, neste mundo pela graça e, no outro, pela glória.
A não ser que, Senhor, seja do vosso serviço e prazer continuar nesta vida e, por isso, dizemos: Seja feita a vossa vontade assim na Terra como no Céu. Quer dizer, rogamos-te, ó Pai, que nos guieis de tal modo que, na Terra, façamos o que mandais e evitemos o que proibis, tudo isto com a perfeição dos anjos e santos no Céu.
Porém, não podendo nós viver sem os bens deste mundo, por isso dizemos: O pão nosso de cada dia nos dai hoje. Isto é, nós te pedimos, Pai, o pão necessário para cada dia (e não o sobejo). A fim de conseguirmos a vida eterna, pois sem a tua providência nada aproveita o trabalho, dá-nos também hoje o pão espiritual da alma, quer dizer, o teu corpo sagrado e a tua santa doutrina.
E porque, nesta vida, nunca estamos sem pecado, por isso dizemos: Perdoai-nos as nossas dívidas assim como nós perdoamos aos nossos devedores.
Assim perdoados, por sermos fracos e temermos o mal que nos pode vir, exclamamos: E não nos deixeis cair em tentação. Quer dizer, pedimos para dela não sermos vencidos.
Finalmente, vivendo nós cercados, nesta vida, por muitos males, por isso pedimos: Mas livrai-nos do mal. Do mal presente, na medida em que nos pode induzir a pecar, disso nos livrai. Contudo, não pedimos para não padecermos adversidade, com a condição de elas não nos causarem dano.
Ámen.

(Cf. Inéditos de Alcobaça, T. 1, Coimbra, 1829, paginas 215-218, ed. Por Frei Fortunato de S. Boaventura).

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