O jovem Dehon em Aventuras no Egito
No primeiro de março houve atrasos na viagem no rio Nilo
devido ao vento e às areias. Encalhamos. Os nossos homens não chegaram para
tirar-nos do apuro: após cinco horas de forças inúteis, foram ajudados pela equipagem
doutro barco que passava.
Um sírio dirigiu-se a nós a pedir o bagchich. Mal recebido e
chicoteado pelo meu companheiro por causa da sua importunidade, ele puxou do
sabre para se vingar, mas um dos nossos cameleiros acalmou-o.
Na volta, atravessando o deserto, encontrámos um acampamento
de beduínos, um chacal errante e caçadores de gazelas.
De tarde, produziam-se espantosos efeitos de miragem.
Dir-se-ia que ao Norte havia um lago imenso no qual se refletiam árvores,
aldeias e a pirâmide de Meidum.
Do Egito à Palestina, seguimos a estrada do deserto.
Durante a noite acampámos mesmo na estrada. Um chacal veio cheirar
as nossas provisões.
A 21 de março, os passaportes, fim do deserto. Formalidades
maçadoras. O médico do forte devia certificar-se da nossa saúde. O Mudir ou
governador devia assinar os nossos passaportes, mas, disseram-nos que ele só se
levanta ao meio-dia. E ainda tivemos de lutar, à partida, com um Beduíno que
reclamava 5 francos por passageiro para a portagem do deserto. O meu
companheiro e cozinheiro empurraram-no e chicotearam-no, e ele deixou-nos em
paz.
Após 7 horas de marcha, chegámos ao fim do deserto.
Passámos da África para a Ásia, e do território egípcio para
o território turco.
Um incidente de fronteira por pouco não interrompia
bruscamente a nossa viagem.
O sultão estabelecera um cordão sanitário rigoroso. Um
indivíduo pediu-nos o nosso atestado de boa saúde passado pelos médicos
egípcios. Nós o tínhamos. Eles chamavam isso ‘Patenta’. É uma palavra italiana.
O meu companheiro não percebeu e chicoteou esse importuno, que, aliás, não
vestia nenhuma farda oficial. Descobrimos que era um soldado do
Grão-Turco. O caso era grave: chicotear
um soldado do Nizan. O oficial do posto decidiu que iriam prender-nos, para
despachar-nos depois para Constantinopla.
O caso virava-se trágico. Eu parlamentei, tanto por meio do
intérprete como pelas poucas palavras de árabe que eu sabia. Ofereci uma
compensação monetária ao soldado. Mas este resistiu e achou que a honra dum
soldado turco valia mais do que o dinheiro. Bravo, tais sentimentos só mereciam
louvores. Finalmente consegui fazer valer o facto de que o soldado não vestia a
farda, o que mudava completamente a questão, e que o meu companheiro não tinha
percebido que lhe pediam a ‘Palenta’, mas que ele julgara ser um vulgar
pedinte. Deixaram-nos livres depois de horas. Mas durante uns instantes pensei
que em vez de passar as festas da Páscoa nos lugares santos, iríamos passá-las
em Istambul.
Chegámos a Gaza só à noite e tivemos de acampar fora da
cidade.
(Cf. NHV, 1864)
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