segunda-feira, 31 de julho de 2023

O jovem Leão Dehon (6)

O jovem Dehon em Aventuras no Egito

No primeiro de março houve atrasos na viagem no rio Nilo devido ao vento e às areias. Encalhamos. Os nossos homens não chegaram para tirar-nos do apuro: após cinco horas de forças inúteis, foram ajudados pela equipagem doutro barco que passava.

Um sírio dirigiu-se a nós a pedir o bagchich. Mal recebido e chicoteado pelo meu companheiro por causa da sua importunidade, ele puxou do sabre para se vingar, mas um dos nossos cameleiros acalmou-o.

Na volta, atravessando o deserto, encontrámos um acampamento de beduínos, um chacal errante e caçadores de gazelas.

De tarde, produziam-se espantosos efeitos de miragem. Dir-se-ia que ao Norte havia um lago imenso no qual se refletiam árvores, aldeias e a pirâmide de Meidum.

Do Egito à Palestina, seguimos a estrada do deserto.

Durante a noite acampámos mesmo na estrada. Um chacal veio cheirar as nossas provisões.

A 21 de março, os passaportes, fim do deserto. Formalidades maçadoras. O médico do forte devia certificar-se da nossa saúde. O Mudir ou governador devia assinar os nossos passaportes, mas, disseram-nos que ele só se levanta ao meio-dia. E ainda tivemos de lutar, à partida, com um Beduíno que reclamava 5 francos por passageiro para a portagem do deserto. O meu companheiro e cozinheiro empurraram-no e chicotearam-no, e ele deixou-nos em paz.

Após 7 horas de marcha, chegámos ao fim do deserto. 

Passámos da África para a Ásia, e do território egípcio para o território turco. 

Um incidente de fronteira por pouco não interrompia bruscamente a nossa viagem.

O sultão estabelecera um cordão sanitário rigoroso. Um indivíduo pediu-nos o nosso atestado de boa saúde passado pelos médicos egípcios. Nós o tínhamos. Eles chamavam isso ‘Patenta’. É uma palavra italiana. O meu companheiro não percebeu e chicoteou esse importuno, que, aliás, não vestia nenhuma farda oficial. Descobrimos que era um soldado do Grão-Turco.  O caso era grave: chicotear um soldado do Nizan. O oficial do posto decidiu que iriam prender-nos, para despachar-nos depois para Constantinopla.

O caso virava-se trágico. Eu parlamentei, tanto por meio do intérprete como pelas poucas palavras de árabe que eu sabia. Ofereci uma compensação monetária ao soldado. Mas este resistiu e achou que a honra dum soldado turco valia mais do que o dinheiro. Bravo, tais sentimentos só mereciam louvores. Finalmente consegui fazer valer o facto de que o soldado não vestia a farda, o que mudava completamente a questão, e que o meu companheiro não tinha percebido que lhe pediam a ‘Palenta’, mas que ele julgara ser um vulgar pedinte. Deixaram-nos livres depois de horas. Mas durante uns instantes pensei que em vez de passar as festas da Páscoa nos lugares santos, iríamos passá-las em Istambul.

Chegámos a Gaza só à noite e tivemos de acampar fora da cidade.

(Cf. NHV, 1864)


Sem comentários: