terça-feira, 30 de novembro de 2021

À descoberta da Madeira


Foi assim há precisamente 75 anos:

“Num dia de novembro (de 1946), pelas quatro horas da tarde, o Provincial veio dizer-me:

- Pensei que tu fazias um jeitão lá na Madeira, na Escola de Artes e Ofícios… sabes de eletricidade….

O mais difícil foi dizer aos meus pais! Primeiro ao pai… depois à mãe!

- Onde é a Madeira?

A verdade é que eu não sabia bem onde estivesse esta Madeira.

Procurei no planisfério dependurado na sala de jantar. Havia lá no meio de tanta água; mas o sinal da ilha perdia-se entre outras letras e marcas.

- Está no meio do Oceano…

Ficaram na mesma.

Foi uma minha tia, grande devoradora de livros, que resolveu o problema e tornou a Madeira familiar em minha casa.

Encontrou um romance italiano que fala de “um dia na Madeira”.

O livro foi lido… estudado! Ilha maravilhosa, cheia de flores… clima ótimo. Meus pais ficaram um tanto aliviados.

Mais aliviados ficaram quando, uns dias depois, lhes pude apresentar o meu Superior: Pe. Ângelo Colombo.

Ficaram logo a gostar do homem.

- Confiamos-lhe o nosso filho – disse meu pai.

- É tão criança ainda – acrescentou minha mãe.

Eu era um rapaz de 25 anos, saído há meses do seminário, com os olhos fechados, apenas com um desejo grande de semear a Boa Nova aos pobres.

O Pe. Colombo, já com 2 anos de sacerdócio, uns tantos de Universidade, com o seu doutoramento, com uma experiência romana… e, especialmente, um padre com verticalidade e humanidade servidas por uma inteligência serena e clara, foi a pessoa escolhida pela Providência, capaz de responder ao desígnio que tinha sobre nós.

Passámos o último mês na azáfama da preparação da partida.

Pus-me a estudar também português. Empresa difícil!

Comprei a única gramática que havia no comércio naquele tempo: o Ragliavini. Começava, como é natural, pela pronúncia.

Desanimei!

Umas tantas maneiras de pronunciar o ‘e’, outras tantas de pronunciar ‘a’, meia dúzia de sibilantes e regras sem fim.

Estava mesmo para largar tudo da mão quando, mais adiante, encontrei um trecho em português que me encantou. Era a descrição da menina de olhos verdes de “As Viagens da Minha Terra”. À minha maneira, mas entendi tudo. Aquele trecho, reconciliou-me com a língua portuguesa para sempre!”

Isto foi há 75 anos, nas vésperas de partirem para Portugal e fixarem-se na Madeira!

 

(CF. Memórias pessoais do Pe. Gastão Canova)

 

Sem comentários: