sexta-feira, 22 de maio de 2020

Padroeiro açoriano (1)

Solenidade na Diocese de Angra – B. João Baptista Machado, presbítero e mártir, padroeiro principal

Beato João Baptista Machado de Távora
Protetor da cidade de Angra do Heroísmo e toda a diocese.

Não é a extensão do território, a riqueza dos produtos, a força dos exércitos que faz grande uma Pátria, mas sim, a inspiração dos seus génios, a virtude e o heroísmo dos seus santos.
São estes que imprimem a um povo a sua verdadeira fisionomia espiritual, e permanecem para além das vicissitudes do tempo e dos acontecimentos como Luz imaculada a dar sentido e beleza à vida humana.
O heroísmo e santidade do beato João Baptista Machado devem constituir motivo de orgulho para os terceirenses, que pisando a esteira luminosa do seu peregrinar e sob o seu patrocínio encontrarão Aquele que se intitulou: Eu sou o caminho, a Verdade e a Vida.

EXPLICAÇÂO
De algum tempo a esta parte venho coligindo elementos para publicar um pequeno folheto, de carácter popular, sobre a vida do glorioso mártir terceirense, o Beato João Baptista Machado, unicamente como fum de o tornar mais conhecido, apreciado e venerado do povo humilde e bom desta ilha.
Não será uma obra literária, nem tão pouco uma pedra para o edifício que o Beato João Baptista Machado tem direito a esperar dos terceirenses: será o rasgar humilde dos alicerces dessa obra que outros, pela sua cultura, têm a obrigação moral de erigir.
Devidamente autorizado limito-me, por agora, a reeditar esta biografia de autor anónimo, publicada em 1875, respeitando a redação, mas atualizando a ortografia.
O Editor.

























I – Vida do Beato João Baptista Machado

Nasceu João Baptista Machado de Távora na Cidade de Angra do heroísmo, no ano de 1582, em uma casa que depois foi incorporada no edifício chamado Colégio, que pertenceu à Companhia de Jesus; e foram seus pais Cristóvão Nunes Vieira e Maria Cota da Malha, pessoas de grande nobreza.
Tendo apenas 16 anos de idade, foi mandado por seus pais à Corte de Madrid, que então dominava nefastamente estes Reinos, tratar importantes negócios de família. Logo que chegou ao Continente, ardendo em desejos de fazer parte da Companhia de Jesus, se dirigiu a Coimbra, e conseguiu ser admitido ao noviciado no célebre Colégio, que a mesma ali tinha.
Desde menino, tendo apenas de seis a sete anos, costumava dizer – que um dia havia de pertencer à Companhia de Jesus, ir às remotíssimas terras do Japão pregar o Evangelho e, ultimamente, dar a vida pela Fé Católica! Era esta uma ideia fixa, que longe de amortecer, ia cada vez mais avivando-se com o progresso da idade e da virtude. Concluído o noviciado, e tendo desistido dum vínculo que lhe pertencia e de todos os bens do mundo, foi admitido na Companhia, e tais instancias começou a fazer a seus superiores, para que o mandassem para as missões da Índia, e determinadamente para as do Japão, que conhecendo-se claramente por ser vocação do Céu, em 1891, o mandaram com muitos outros missionários para a Índia, não tendo decorrido ainda um ano depois de findo o noviciado.
Em Goa estudou Filosofia, e passando depois para Macau, ali estudou Teologia, partindo logo para o Japão no ano de 1609; o que eram todas as suas aspirações. Como porém ignorava a língua daquele país, foi-lhe indispensável exercitar-se primeiramente nela; o que tece lugar no Colégio de Arima com tal facilidade e perfeição, que em breve se achou em circunstâncias de se apresentar a pregar o Evangelho à Corte de Meaco, e à Cidade de Fuximo, principal fortaleza do Império.
Pouco tempo se demorou nestas cidades, passando para Nagasáqui, onde, estando no maior vigor da sua idade, e abrasado em zelo pela honra e glória de Deus nosso senhor e salvação das almas, exerceu o ministério paroquial por alguns anos com tal aproveitamento, como se tivesse muitos e zelosos cooperadores que o coadjuvassem.
Porém no ano de 1614 publicou-se em Macau o decreto que ordenava saírem do Japão todos os missionários católicos, e este acontecimento muito contrariou o ardente desejo que tinha o nosso fervoroso apóstolo de persistir no Japão, e de dar a vida pela Fé. Por isso, não lhe sendo possível contrariar as ordens de seus superiores, que o mandavam sair, empenhou ardentemente ao Céu, para que dispusesse as coisas de modo que ali ficasse. E assim o conseguiu; porque os Cristãos daquela terra, na véspera em que os Padres dela deviam sair, com tantas lágrimas e instâncias pediram – que ao menos um ficasse entre eles, obrigando-se a ocultá-lo de modo que a sua permanência ali fosse desconhecida, que o Superior dos missionários, anuindo às suas súplicas, lhes concedeu um, recaindo a escolha, por disposição do Céu, em o ditoso João Baptista.
Para maior segurança o colocaram os fiéis na ilha de Consura, e depois nas de Goto; mas para o ardente zelo do Padre eram estreitos estes limites, e escassa a messe que diante de seus olhos se apresentava. E a segurança em que se lhe figurava estar de não ser descoberto pela Autoridade, longe de o consolar, lhe causava grande tristeza e inquietação; porque as suas aspirações eram dar a vida por Aquele que primeiro por nós a tinha dado. E por isso começou a pretender, e a fazer todos os esforços para sair das Ilhas para o Continente do Japão, com o fim de se apresentar a pregar publicamente nas terras de Arima e Ximabara, onde lhe constava serem maiores as pesquisas e a perseguição contra os Cristãos. Não pôde no entanto realizar o seu intento, porque os fiéis a isso se opuseram constante e firmemente, conhecendo o perigo a que se exporia, e não querendo de modo algum perdê-lo. Por três anos pois esteve o nosso padre nestas Ilhas.
Como, porém, não procurasse disfarçar-se, nem ocultar o exercício do seu sagrado ministério, porque o seu ardente desejo era ser descoberto para dar a vida pela Fé; e como redobrassem por toda a parte as pesquisas sobre os missionários, que se suponha terem ficado escondidos no Império, fácil foi ser descoberto. E nos princípios de Abril do ano de 1617, estando a administrar o sacramento da Penitência, teve lugar a sua prisão. Logo que esta voz foi dada, começou a dar graças a Deus por tão distinto favor – de sofrer por sua causa, e declarou solenemente que, do fundo do coração, não só perdoava ao Tono, que era o autoridade que o tinha mandado prender, e aos ministros que executavam suas ordens, mas lhes agradecia tão grande favor, e tudo quanto lhe dessem a sofrer!
Quatro dias se demorou ainda o nosso Bem-aventurado nesta Ilha, por falta de ocasião oportuna de passar a Omura, e entretanto continuava a exercer o seu sagrado ministério, consolando os fiéis com a consideração de que estava destinado pelo Céu ir sofrer pela Fé ao Japão porque desde menino tinha tido sempre essa constante ideia, e ardente desejo. Embarcado, esperava ele que o tratassem com rigor e aspereza, como criminoso, e vendo que, pelo contrário, tinham para consigo todas as atenções, foi ter com o oficial que o tinha ido prender, pedindo-lhe – o mandasse amarrar, porque a sua glória era sofrer por nosso Senhor Jesus Cristo; mas não pôde obter a satisfação deste desejo, respeitando-o os próprios pagãos, e não lhe fazendo violência alguma. Chegados à cidade de Omura o meteram num cárcere, chamado Cori onde se conservou até ao dia 22 de Maio, em que sofreu o martírio.
Aqui foram satisfeitos os desejos do Mártir, não pelas violências e tormentos, que lhe causassem os homens, mas pelos presentes do Céu; pois que mimos, e preciosos, são os sofrimentos que o Senhor manda aos seus escolhidos: As dores que aqui padeço são tão grandes que se parecem com a mesma morte, escrevia ele do cárcere. Bendito seja o Senhor; pois é servido de dá-las, já que os apertos do cárcere não são tão rigorosos como eu esperava. Bem é que tenha por outra via ocasião de padecer por ensaio de outros tormentos maiores, que pelo amor de Deus espero levar. Dou graças à sua Divina Majestade, que desde a hora em que me prenderam ate esta presente não cuido senão quando me verei em uma cruz, ou debaixo de uma catana. Bendito seja Deus que assim consola os que por Ele tão pouco padecem. Haverá quarenta dias, ou mais, que me tratam mal estas dores, e, por este lugar ser tão húmido, me molestam tanto, que nem de noite, nem de dia posso repousar. Tenho-o por grande mercê de Deus, já que me não dão outros tormentos, receber da sua Divina mão estas dores, que são como de morte. Dou graças a nosso Senhor por me dar uma serenidade e quietude grande, que não há coisa que mais deseje que o estado que tenho e padeço por seu amor!
Entretanto proferia o tirano Xagum em Yédo sentença de morte contra o nosso ditoso Confessor da fé, que mandava executar a Omurandono, príncipe daquele Estado, o qual encarregou Tomoranga Lino, seu valido e governador de sua casa e Estado, de a dar à execução.
(continua)

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