Beato João Baptista Machado de Távora
Protetor da cidade de Angra do Heroísmo e
toda a diocese.
Não
é a extensão do território, a riqueza dos produtos, a força dos exércitos que
faz grande uma Pátria, mas sim, a inspiração dos seus génios, a virtude e o
heroísmo dos seus santos.
São
estes que imprimem a um povo a sua verdadeira fisionomia espiritual, e
permanecem para além das vicissitudes do tempo e dos acontecimentos como Luz
imaculada a dar sentido e beleza à vida humana.
O
heroísmo e santidade do beato João Baptista Machado devem constituir motivo de
orgulho para os terceirenses, que pisando a esteira luminosa do seu peregrinar
e sob o seu patrocínio encontrarão Aquele que se intitulou: Eu sou o caminho, a
Verdade e a Vida.
EXPLICAÇÂO
De
algum tempo a esta parte venho coligindo elementos para publicar um pequeno
folheto, de carácter popular, sobre a vida do glorioso mártir terceirense, o
Beato João Baptista Machado, unicamente como fum de o tornar mais conhecido,
apreciado e venerado do povo humilde e bom desta ilha.
Não
será uma obra literária, nem tão pouco uma pedra para o edifício que o Beato
João Baptista Machado tem direito a esperar dos terceirenses: será o rasgar
humilde dos alicerces dessa obra que outros, pela sua cultura, têm a obrigação
moral de erigir.
Devidamente
autorizado limito-me, por agora, a reeditar esta biografia de autor anónimo,
publicada em 1875, respeitando a redação, mas atualizando a ortografia.
O
Editor.
I – Vida do Beato João Baptista Machado
Nasceu João Baptista
Machado de Távora na Cidade de Angra do heroísmo, no ano de 1582, em uma casa que
depois foi incorporada no edifício chamado Colégio, que pertenceu à Companhia
de Jesus; e foram seus pais Cristóvão Nunes Vieira e Maria Cota da Malha,
pessoas de grande nobreza.
Tendo
apenas 16 anos de idade, foi mandado
por seus pais à Corte de Madrid, que então dominava nefastamente estes Reinos,
tratar importantes negócios de família. Logo que chegou ao Continente, ardendo
em desejos de fazer parte da Companhia
de Jesus, se dirigiu a Coimbra, e conseguiu ser admitido ao noviciado no
célebre Colégio, que a mesma ali tinha.
Desde
menino, tendo apenas de seis a sete anos, costumava dizer – que um dia havia de
pertencer à Companhia de Jesus, ir às remotíssimas terras do Japão pregar o
Evangelho e, ultimamente, dar a vida pela Fé Católica! Era esta uma ideia fixa,
que longe de amortecer, ia cada vez mais avivando-se com o progresso da idade e
da virtude. Concluído o noviciado, e tendo desistido dum vínculo que lhe
pertencia e de todos os bens do mundo, foi admitido na Companhia, e tais
instancias começou a fazer a seus superiores, para que o mandassem para as
missões da Índia, e determinadamente para as do Japão, que conhecendo-se
claramente por ser vocação do Céu, em
1891, o mandaram com muitos outros missionários para a Índia, não tendo
decorrido ainda um ano depois de findo o noviciado.
Em
Goa estudou Filosofia, e passando depois
para Macau, ali estudou Teologia, partindo logo para o Japão no ano de 1609; o que eram todas as suas aspirações.
Como porém ignorava a língua daquele país, foi-lhe indispensável exercitar-se
primeiramente nela; o que tece lugar no Colégio de Arima com tal facilidade e
perfeição, que em breve se achou em circunstâncias de se apresentar a pregar o
Evangelho à Corte de Meaco, e à Cidade de Fuximo, principal fortaleza do
Império.
Pouco
tempo se demorou nestas cidades, passando para Nagasáqui, onde, estando no maior
vigor da sua idade, e abrasado em zelo pela honra e glória de Deus nosso senhor
e salvação das almas, exerceu o ministério paroquial por alguns anos com tal
aproveitamento, como se tivesse muitos e zelosos cooperadores que o
coadjuvassem.
Porém
no ano de 1614 publicou-se em Macau o
decreto que ordenava saírem do Japão todos os missionários católicos, e
este acontecimento muito contrariou o ardente desejo que tinha o nosso
fervoroso apóstolo de persistir no Japão, e de dar a vida pela Fé. Por isso,
não lhe sendo possível contrariar as ordens de seus superiores, que o mandavam
sair, empenhou ardentemente ao Céu, para que dispusesse as coisas de modo que
ali ficasse. E assim o conseguiu; porque os Cristãos daquela terra, na véspera
em que os Padres dela deviam sair, com tantas lágrimas e instâncias pediram –
que ao menos um ficasse entre eles, obrigando-se a ocultá-lo de modo que a sua
permanência ali fosse desconhecida, que o Superior dos missionários, anuindo às
suas súplicas, lhes concedeu um, recaindo a escolha, por disposição do Céu, em
o ditoso João Baptista.
Para
maior segurança o colocaram os fiéis na ilha de Consura, e depois nas de Goto;
mas para o ardente zelo do Padre eram estreitos estes limites, e escassa a
messe que diante de seus olhos se apresentava. E a segurança em que se lhe
figurava estar de não ser descoberto pela Autoridade, longe de o consolar, lhe causava
grande tristeza e inquietação; porque as suas aspirações eram dar a vida por
Aquele que primeiro por nós a tinha dado. E por isso começou a pretender, e a
fazer todos os esforços para sair das Ilhas para o Continente do Japão, com o
fim de se apresentar a pregar publicamente nas terras de Arima e Ximabara, onde
lhe constava serem maiores as pesquisas e a perseguição contra os Cristãos. Não
pôde no entanto realizar o seu intento, porque os fiéis a isso se opuseram
constante e firmemente, conhecendo o perigo a que se exporia, e não querendo de
modo algum perdê-lo. Por três anos pois esteve o nosso padre nestas Ilhas.
Como,
porém, não procurasse disfarçar-se, nem ocultar o exercício do seu sagrado
ministério, porque o seu ardente desejo era ser descoberto para dar a vida pela
Fé; e como redobrassem por toda a parte as pesquisas sobre os missionários, que
se suponha terem ficado escondidos no Império, fácil foi ser descoberto. E nos
princípios de Abril do ano de 1617,
estando a administrar o sacramento da Penitência, teve lugar a sua prisão.
Logo que esta voz foi dada, começou a dar graças a Deus por tão distinto favor
– de sofrer por sua causa, e declarou solenemente que, do fundo do coração, não
só perdoava ao Tono, que era o autoridade que o tinha mandado prender, e aos
ministros que executavam suas ordens, mas lhes agradecia tão grande favor, e
tudo quanto lhe dessem a sofrer!
Quatro
dias se demorou ainda o nosso Bem-aventurado nesta Ilha, por falta de ocasião
oportuna de passar a Omura, e entretanto continuava a exercer o seu sagrado
ministério, consolando os fiéis com a consideração de que estava destinado pelo
Céu ir sofrer pela Fé ao Japão porque desde menino tinha tido sempre essa
constante ideia, e ardente desejo. Embarcado, esperava ele que o tratassem com
rigor e aspereza, como criminoso, e vendo que, pelo contrário, tinham para
consigo todas as atenções, foi ter com o oficial que o tinha ido prender,
pedindo-lhe – o mandasse amarrar, porque a sua glória era sofrer por nosso
Senhor Jesus Cristo; mas não pôde obter a satisfação deste desejo,
respeitando-o os próprios pagãos, e não lhe fazendo violência alguma. Chegados à cidade de Omura o meteram num
cárcere, chamado Cori onde se conservou até ao dia 22 de Maio, em que sofreu o
martírio.
Aqui
foram satisfeitos os desejos do Mártir, não pelas violências e tormentos, que
lhe causassem os homens, mas pelos presentes do Céu; pois que mimos, e
preciosos, são os sofrimentos que o Senhor manda aos seus escolhidos: As dores
que aqui padeço são tão grandes que se parecem com a mesma morte, escrevia ele
do cárcere. Bendito seja o Senhor; pois é servido de dá-las, já que os apertos
do cárcere não são tão rigorosos como eu esperava. Bem é que tenha por outra
via ocasião de padecer por ensaio de outros tormentos maiores, que pelo amor de
Deus espero levar. Dou graças à sua Divina Majestade, que desde a hora em que
me prenderam ate esta presente não cuido senão quando me verei em uma cruz, ou
debaixo de uma catana. Bendito seja Deus que assim consola os que por Ele tão
pouco padecem. Haverá quarenta dias, ou
mais, que me tratam mal estas dores, e, por este lugar ser tão húmido, me molestam
tanto, que nem de noite, nem de dia posso repousar. Tenho-o por grande
mercê de Deus, já que me não dão outros tormentos, receber da sua Divina mão
estas dores, que são como de morte. Dou graças a nosso Senhor por me dar uma
serenidade e quietude grande, que não há coisa que mais deseje que o estado que
tenho e padeço por seu amor!
Entretanto
proferia o tirano Xagum em Yédo sentença de morte contra o nosso ditoso
Confessor da fé, que mandava executar a Omurandono, príncipe daquele Estado, o
qual encarregou Tomoranga Lino, seu valido e governador de sua casa e Estado,
de a dar à execução.
(continua)
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