sexta-feira, 19 de julho de 2013

Memorial Pe. Colombo (3)


“Cristóvão Colombo descobriu a América,
mas o Pe. Ângelo Colombo descobriu o coração dos Madeirenses!”

O Pe. Angelo Colombo, SCJ, na sessão solene das comemorações dos 25 anos da Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus, a 17 de outubro de 1991 no Colégio Missionário, Funchal, partilhou este discurso:

Estou aqui para lembrar hoje que os fundamentos da presença dehoniana em Portugal foram postos, tal árvore foi plantada aqui, nesta ilha da Madeira!
Ninguém, naquele já longe 1947, teria sonhado isso! No dia 17 de janeiro chegaram a esta ilha da Madeira, no Carvalho Araújo, dois “padrezinhos”, o Pe. Canova e o Pe. Colombo, vindos daquela Itália espezinhada pela guerra. Tinham chegado sem dinheiro. Só tinham ficado com uns 50 escudos, resto da viagem Lisboa-Funchal, pago pela intervenção caridosa da boa alma da Senhora D. Maria Melo Espírito Santo.
Acolheram-nos o venerando Bispo de então, D. António Manuel Pereira Ribeiro e o fundado da Escola de Artes e Ofícios, Pe. Laurindo Leal Pestana, assegurando-nos pão e alojamento.
Que sonhavam e procuravam os dois? Diziam que tinham sido enviados para abrir um seminário para futuros missionários em ajuda às missões de Moçambique!... Com que meios?... A bênção dos superiores que os tinham enviado e a do Sr. Bispo, D. António Manuel Pereira Ribeiro, que os tinha recebido por intervenção da Santa Sé e do Cardeal Arcebispo de Lourenço Marques, o Sr. D. Teodósio Clemente de Gouveia. Muito bem! Mas isso como pode servir para realizar um Seminário com pedra e cal e com uma cozinha a funcionar? Sonhos!
Mas os dois, depois de meses, foram um dia peregrinar a Nossa Senhora do Monte e voltaram decididos: “Vamos à procura de uma casa, alugamo-la e vamos começar um Seminário!”.
Procuraram, encontraram e, com a aprovação e assistência do Sr. Bispo, instalaram-se aqui, na Chácara Brazil, em regime de aluguer. Agora era providenciar os meios de vida.
O Pe. Colombo foi a Lisboa e, no mês de setembro e parte de outubro, procuro algo de indispensável para os começos e depois foi bater à porta do Governo, escrevendo uma cartinha ao mesmo Doutor Oliveira Salazar. Dizia mais ou menos assim: “No espírito da Concordata e do Acordo Missionário entre a Santa Sé e o Governo Português, estamos para abrir um Seminário Missionário no Funchal, em apoio aos missionários italianos que já temos em Moçambique e em concordância com o estabelecido no mesmo Acordo. A Árvore que estamos já para plantar, no Funchal, precisa de água para enraizar e desenvolver. Não será possível compartilharmos, com outros Institutos Missionários da ajuda que o Estado Português anualmente lhes oferece?”
Por meio de um seu secretário, o Exmo. Sr. Doutor Oliveira Salazar respondeu não ser possível fugir ao estabelecido em favor dos Institutos Missionários, até que não fosse determinado em futura revisão da parte do Ministério do Ultramar!...
Os dois padrezinhos não desanimaram. Em vez de partir do alto, começaram a recorrer à base: ao bom povo da Madeira, que entretanto tinham ficado a conhecer, e cujos filhos já estavam na Chácara Brazil, ou seja, no Colégio Missionário.
Por ocasião do Natal, escreveram e distribuíram pelos correios uma cata, tirando as direções da Lista Telefónica e pedindo ajuda… Lembro-me bem que alguns poucos responderam e enviaram algo. A melhor ajuda foi de 50 escudos. Vinha do Sr. Eduardo Paquete.
Os nossos contatos de ministério sacerdotal, as intenções de missas do povo em geral, e de um certo grupo de Senhoras que cuidavam das Missas Reparadoras (que nós assumimos, porque mais conformes ao nosso espírito) foram outra fonte de meios para viver.
Não devemos esquecer que já naquele nosso primeiro Natal na Madeira lembrámo-nos de fazer um pequeno presépio (em parte animado) que atraiu pessoas e que rendeu uns 300 escudos! E quem não lembra os presépios dos anos a seguir, realizados pelo Pe. Luís Celato, no antigo paço do Bispo na Praça do Município?
Cedo nasceram pequenos “Grupos Missionários” no Funchal e fora, que não somente ajudaram financeiramente, mas fizeram conhecer o Colégio Missionário e entusiasmaram muita gente.
Este entusiasmo e este apoio manifestaram-se sobretudo nas chamadas “Festas da Boa Vontade”. Três senhoras: A senhora D. Estrela Gomes Henriques, a senhora D. Lídia Dória Monteiro, a senhora D. Teresa de Bianchi Valparaíso (esta última animadora das outras), foram a alma de tais festas. Nestas apareceram e participaram conhecidos artistas, como a Amália Rodrigues e o madeirense Max, a abrilhantarem aquelas manifestações populares, a favor do Colégio Missionário.
Mas os efeitos destas manifestações não ficaram numa mais ou menos notável e direta ajuda financeira ao Colégio Missionário, mas sim e sobretudo no apoio das autoridades da Madeira a favor do mesmo Colégio. O Governador Civil e Militar, os Presidentes da Junta Regional e da Câmara Municipal do Funchal, passaram a apoiar, quer de uma maneira quer de outra, o que podia facilitar a vida e o progresso daquele Seminário Missionário da Levada.
Até a Alfândega prestava-se, antes dos seus responsáveis a facilitar a passagem de material religioso, dirigido ao Colégio Missionário.
Até o Presidente da Junta renunciava aos direitos da taxa de 1% sobre os calendários e as estampas religiosas que nos vinham da Itália!
Até a PIDE – e isto é o máximo! – parecia nos ajudar, quando já no primeiro ano de vida do Colégio Missionário, nos concedeu como professor de ginástica dos nossos alunos, um seu dependente. E quando renunciava a multar os esquecimentos dos padres italianos em se apresentarem todos os meses para marcar presença!
Faltava um passo para chegarmos ao Governo da Nação. Em março de 1950, estávamos já no terceiro ano de vida do Colégio Missionário e depois da assinatura do contrato de compra da Chácara Brazil, almejávamos um necessário aumento da casa.
Chegou à Madeira naquela altura o Ministro das Obras Públicas Engº Frederico Ulrich. O trio da “Boa Vontade” armou um assalto àquela personagem oficial, de acordo com a Madre Pedro, Superiora das Irmãs de S. José de Cluny no então Sanatório João de Almada. O Sr. Ministro subiu para visitar aquela obra de assistência à saúde. No fim da visita, ao sair da entrada principal daquele estabelecimento o Sr. Ministro encontrou esbarrada a passagem pelo trio da “Boa Vontade”, pela Madre Pedro e pelo Pe. Colombo e ouviu dizer-lhe: “Vossa Excelência é cristão, não é? Amanhã tenciona ir à missa e porque não vir participar na missa da capela do nosso seminário? Desejamos que veja algo!” Olhou-nos por um momento e “porque não?!” respondeu ele.
Na manhã de Domingo, acompanhado de várias personalidades, lá estava ele na nossa “Capela-Garagem”. Escutou a Missa e o canto dos nossos pequenos seminaristas, juntamente com o povo e as senhoras da “Boa Vontade”. No fim, dirigiram-lhe o convite: “Vossa Excelência dignava-se entrar na nossa “casita” e subir ao terraço?”
Fomos e mostrando-lhe aquele espaço do qual o olhar espalhava-se sobre a cidade do Funchal, ouviu-se dizer: “Aqui precisamos de levantar um dormitório para os alunos que vão chegar para o novo ano escolar. Eis o esboço da construção: O Estado não teria a possibilidade de nos ajudar?”
O Ministro observou um instante as coisas e disse: “Há algum trabalho comparticipado que não se realizou e cuja verba está à disposição. Podem mandar-me o projeto para Lisboa quanto antes?”
Antes de nos deixar o Sr. Ministro assinou o registo de honra da casa e nós ajuntámos depois da assinatura, a verba conseguida: 80 contos!
Tínhamos entrado no número dos apoiados do Governo da Nação antes das especificações do Ministério do Ultramar!
Os passos de Deus tinham chegado à sua finalidade através dos caminhos do bom povo da Madeira.
Depois disso, um dia, o grupo da “Boa Vontade” realizou uma reunião das principais senhoras da alta sociedade, que mais colaboravam na ajuda ao Colégio do Sagrado Coração. Na conclusão daquela reunião, o Pe. Colombo levantou-se e disse: “Cristóvão Colombo descobriu a América, mas o Pe. Colombo descobriu a Madeira e o coração dos Madeirenses!”

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