“Cristóvão Colombo descobriu a América,
mas
o Pe. Ângelo Colombo descobriu o coração dos Madeirenses!”
O
Pe. Angelo Colombo, SCJ, na sessão solene das comemorações dos 25 anos da
Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus, a 17 de outubro de
1991 no Colégio Missionário, Funchal, partilhou este discurso:
Estou
aqui para lembrar hoje que os fundamentos da presença dehoniana em Portugal foram
postos, tal árvore foi plantada aqui, nesta ilha da Madeira!
Ninguém,
naquele já longe 1947, teria sonhado isso! No dia 17 de janeiro chegaram a esta
ilha da Madeira, no Carvalho Araújo, dois “padrezinhos”, o Pe. Canova e o Pe.
Colombo, vindos daquela Itália espezinhada pela guerra. Tinham chegado sem
dinheiro. Só tinham ficado com uns 50 escudos, resto da viagem Lisboa-Funchal,
pago pela intervenção caridosa da boa alma da Senhora D. Maria Melo Espírito
Santo.
Acolheram-nos
o venerando Bispo de então, D. António Manuel Pereira Ribeiro e o fundado da
Escola de Artes e Ofícios, Pe. Laurindo Leal Pestana, assegurando-nos pão e
alojamento.
Que
sonhavam e procuravam os dois? Diziam que tinham sido enviados para abrir um
seminário para futuros missionários em ajuda às missões de Moçambique!... Com
que meios?... A bênção dos superiores que os tinham enviado e a do Sr. Bispo,
D. António Manuel Pereira Ribeiro, que os tinha recebido por intervenção da
Santa Sé e do Cardeal Arcebispo de Lourenço Marques, o Sr. D. Teodósio Clemente
de Gouveia. Muito bem! Mas isso como pode servir para realizar um Seminário com
pedra e cal e com uma cozinha a funcionar? Sonhos!
Mas
os dois, depois de meses, foram um dia peregrinar a Nossa Senhora do Monte e
voltaram decididos: “Vamos à procura de uma casa, alugamo-la e vamos começar um
Seminário!”.
Procuraram,
encontraram e, com a aprovação e assistência do Sr. Bispo, instalaram-se aqui,
na Chácara Brazil, em regime de aluguer. Agora era providenciar os meios de
vida.
O
Pe. Colombo foi a Lisboa e, no mês de setembro e parte de outubro, procuro algo
de indispensável para os começos e depois foi bater à porta do Governo,
escrevendo uma cartinha ao mesmo Doutor Oliveira Salazar. Dizia mais ou menos
assim: “No espírito da Concordata e do Acordo Missionário entre a Santa Sé e o
Governo Português, estamos para abrir um Seminário Missionário no Funchal, em
apoio aos missionários italianos que já temos em Moçambique e em concordância
com o estabelecido no mesmo Acordo. A Árvore que estamos já para plantar, no
Funchal, precisa de água para enraizar e desenvolver. Não será possível
compartilharmos, com outros Institutos Missionários da ajuda que o Estado
Português anualmente lhes oferece?”
Por
meio de um seu secretário, o Exmo. Sr. Doutor Oliveira Salazar respondeu não
ser possível fugir ao estabelecido em favor dos Institutos Missionários, até
que não fosse determinado em futura revisão da parte do Ministério do
Ultramar!...
Os
dois padrezinhos não desanimaram. Em vez de partir do alto, começaram a
recorrer à base: ao bom povo da Madeira, que entretanto tinham ficado a
conhecer, e cujos filhos já estavam na Chácara Brazil, ou seja, no Colégio
Missionário.
Por
ocasião do Natal, escreveram e distribuíram pelos correios uma cata, tirando as
direções da Lista Telefónica e pedindo ajuda… Lembro-me bem que alguns poucos
responderam e enviaram algo. A melhor ajuda foi de 50 escudos. Vinha do Sr.
Eduardo Paquete.
Os
nossos contatos de ministério sacerdotal, as intenções de missas do povo em
geral, e de um certo grupo de Senhoras que cuidavam das Missas Reparadoras (que
nós assumimos, porque mais conformes ao nosso espírito) foram outra fonte de
meios para viver.
Não
devemos esquecer que já naquele nosso primeiro Natal na Madeira lembrámo-nos de
fazer um pequeno presépio (em parte animado) que atraiu pessoas e que rendeu
uns 300 escudos! E quem não lembra os presépios dos anos a seguir, realizados
pelo Pe. Luís Celato, no antigo paço do Bispo na Praça do Município?
Cedo
nasceram pequenos “Grupos Missionários” no Funchal e fora, que não somente
ajudaram financeiramente, mas fizeram conhecer o Colégio Missionário e
entusiasmaram muita gente.
Este
entusiasmo e este apoio manifestaram-se sobretudo nas chamadas “Festas da Boa
Vontade”. Três senhoras: A senhora D. Estrela Gomes Henriques, a senhora D.
Lídia Dória Monteiro, a senhora D. Teresa de Bianchi Valparaíso (esta última
animadora das outras), foram a alma de tais festas. Nestas apareceram e
participaram conhecidos artistas, como a Amália Rodrigues e o madeirense Max, a
abrilhantarem aquelas manifestações populares, a favor do Colégio Missionário.
Mas
os efeitos destas manifestações não ficaram numa mais ou menos notável e direta
ajuda financeira ao Colégio Missionário, mas sim e sobretudo no apoio das
autoridades da Madeira a favor do mesmo Colégio. O Governador Civil e Militar,
os Presidentes da Junta Regional e da Câmara Municipal do Funchal, passaram a
apoiar, quer de uma maneira quer de outra, o que podia facilitar a vida e o
progresso daquele Seminário Missionário da Levada.
Até
a Alfândega prestava-se, antes dos seus responsáveis a facilitar a passagem de
material religioso, dirigido ao Colégio Missionário.
Até
o Presidente da Junta renunciava aos direitos da taxa de 1% sobre os
calendários e as estampas religiosas que nos vinham da Itália!
Até
a PIDE – e isto é o máximo! – parecia nos ajudar, quando já no primeiro ano de
vida do Colégio Missionário, nos concedeu como professor de ginástica dos
nossos alunos, um seu dependente. E quando renunciava a multar os esquecimentos
dos padres italianos em se apresentarem todos os meses para marcar presença!
Faltava
um passo para chegarmos ao Governo da Nação. Em março de 1950, estávamos já no
terceiro ano de vida do Colégio Missionário e depois da assinatura do contrato
de compra da Chácara Brazil, almejávamos um necessário aumento da casa.
Chegou
à Madeira naquela altura o Ministro das Obras Públicas Engº Frederico Ulrich. O
trio da “Boa Vontade” armou um assalto àquela personagem oficial, de acordo com
a Madre Pedro, Superiora das Irmãs de S. José de Cluny no então Sanatório João
de Almada. O Sr. Ministro subiu para visitar aquela obra de assistência à
saúde. No fim da visita, ao sair da entrada principal daquele estabelecimento o
Sr. Ministro encontrou esbarrada a passagem pelo trio da “Boa Vontade”, pela
Madre Pedro e pelo Pe. Colombo e ouviu dizer-lhe: “Vossa Excelência é cristão,
não é? Amanhã tenciona ir à missa e porque não vir participar na missa da
capela do nosso seminário? Desejamos que veja algo!” Olhou-nos por um momento e
“porque não?!” respondeu ele.
Na
manhã de Domingo, acompanhado de várias personalidades, lá estava ele na nossa
“Capela-Garagem”. Escutou a Missa e o canto dos nossos pequenos seminaristas,
juntamente com o povo e as senhoras da “Boa Vontade”. No fim, dirigiram-lhe o
convite: “Vossa Excelência dignava-se entrar na nossa “casita” e subir ao
terraço?”
Fomos
e mostrando-lhe aquele espaço do qual o olhar espalhava-se sobre a cidade do
Funchal, ouviu-se dizer: “Aqui precisamos de levantar um dormitório para os
alunos que vão chegar para o novo ano escolar. Eis o esboço da construção: O Estado
não teria a possibilidade de nos ajudar?”
O
Ministro observou um instante as coisas e disse: “Há algum trabalho
comparticipado que não se realizou e cuja verba está à disposição. Podem
mandar-me o projeto para Lisboa quanto antes?”
Antes
de nos deixar o Sr. Ministro assinou o registo de honra da casa e nós ajuntámos
depois da assinatura, a verba conseguida: 80 contos!
Tínhamos
entrado no número dos apoiados do Governo da Nação antes das especificações do
Ministério do Ultramar!
Os
passos de Deus tinham chegado à sua finalidade através dos caminhos do bom povo
da Madeira.
Depois
disso, um dia, o grupo da “Boa Vontade” realizou uma reunião das principais
senhoras da alta sociedade, que mais colaboravam na ajuda ao Colégio do Sagrado
Coração. Na conclusão daquela reunião, o Pe. Colombo levantou-se e disse:
“Cristóvão Colombo descobriu a América, mas o Pe. Colombo descobriu a Madeira e
o coração dos Madeirenses!”
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