A pregação de hoje ou o sermão deste dia vai estar a cargo de Camões porque ocorre hoje os 500 anos do seu nascimento.
NASCIMENTO
Luís
Vaz de Camões terá nascido, segundo alguns investigadores, a 23 de janeiro de 1524, dia de
um eclipse solar visível em Portugal. O próprio poeta refere num seu
soneto esse acontecimento:
O
dia em que nasci moura e pereça,
Não
o queira jamais o tempo dar;
Não
torne mais ao Mundo, e, se tornar,
Eclipse
nesse passo o Sol padeça.
A
luz lhe falte. O Sol se [lhe] escureça,
Mostre
o Mundo sinais de se acabar,
Nasçam-lhe
monstros, sangue chova o ar,
A
mãe ao próprio filho não conheça.
As
pessoas pasmadas, de ignorantes,
As
lágrimas no rosto, a cor perdida,
Cuidem
que o mundo já se destruiu.
Ó
gente temerosa, não te espantes,
Que
este dia deitou ao Mundo a vida
Mais
desgraçada que jamais se viu!
OBRA
Para
além do seu poema épico Os Lusíadas, publicado em 1572, escreveu centenas de
poemas (Lírica, sonetos, redondilhas e elegias) e ainda 3 peças de teatro.
SERMÃO
Vamos
dar a palavra a Camões para nos pregar neste dia através de passagens ou
mensagens retiradas de Os Lusíadas.
1)
– O Deus em quem acredita:
A
Lei tenho d’Aquele a cujo império
Obedece
o visíbil e invisíbil,
Aquele que criou todo o Hemisfério,
Tudo
o que sente e todo o insensibil;
Que padeceu desonra e
vitupério,
Sofrendo
morte injusta e insofríbil,
E
que do Céu à Terra, enfim,
desceu,
Por subir os mortais da Terra ao Céu. (Os Lusíadas,
65, I)
O
mesmo testemunho desenvolvido num soneto de Natal:
Dos Céus à terra desce a mor Beleza,
Une-se à nossa carne a falá-la nobre;
E
sendo a humanidade dantes
pobre,
Hoje subida fica à mor alteza.
Busca
o Senhor mais rico a mor pobreza;
Que
ao mundo o seu amor descobre,
De
palhas vis o corpo tenro cobre,
E
por elas o mesmo Céu despreza.
Como?
Deus em pobreza à terra
desce.
O
que é mais pobre tanto lhe contenta,
Que
este somente rico lhe parece.
Pobreza
este Presépio representa;
Mas
tanto por ser pobre já merece,
Que
quanto mais o é, mais lhe contenta.
O
mesmo tema desenvolvido na história da salvação noutro soneto:
Desce
do Céu imenso, Deus benino,
Para
encarnar na Virgem soberana.
"Porque desce divino em cousa
humana?"
"Para subir o humano a ser Divino".
"Pois
como vem tão pobre e tão minino,
Rendendo-se
ao poder da mão tirana?"
"Porque
vem receber morte inumana
Para
pagar de Adão o desatino".
"Pois
como? Adão e Eva o fruto comem
Que
por seu próprio Deus lhe foi vedado?"
"Si,
por que o próprio ser de deuses tomem".
"E
por essa razão foi humanado?"
"Si.
Porque foi com causa decretado,
Se o homem quis ser deus, que Deus seja
homem".
2)
– A sua fé e confiança:
Quem poderá do mal aparelhado
Livrar-se sem perigo, sabiamente,
Se lá de cima a Guarda Soberana
Não acudir à fraca força humana? (30, II)
Vendo
Vasco da Gama que tão perto
Do
fim de seu desejo se perdia,
Vendo
ora o mar até o Inferno aberto,
Ora
com nova fúria ao Céu subia,
Confuso
de temor, da vida incerto,
Onde
nenhum remédio lhe valia,
Chama aquele Remédio santo e forte,
Que o impossíbil pode, desta sorte:
(80, VI)
Divina Guarda, angélica, celeste,
Que os Céus, o Mar e Terra senhoriais:
Tu,
que a todo Israel refúgio deste
Por
metade das águas Eritreias;
Tu,
que livraste Paulo e defendeste
Das
Sirtes arenosas e ondas feias, (81, VI)
3)
– Missão atribuída por Deus
Deus, por certo, vos traz, porque
pretende
Algum serviço Seu por vós obrado;
Por
isso só vos guia e vos defende
Dos
imigos, do mar, do vento irado. (30, VII
No
fim de tantos casos trabalhosos
Porque
somos de Ti desemparados,
Se este nosso trabalho não Te ofende,
Mas antes Teu serviço só pretende? (83, VI)
4)
– Ação de graças
Os geolhos no chão; as mãos ao Céu,
A mercê grande a Deus agardeceo (93, VI)
As graças a Deus dava, e razão tinha,
Que
não somente a terra lhe mostrava
Que,
com tanto temo, buscando vinha,
Por
quem tanto trabalho experimentava,
Mas
via-se livrado, tão asinha,
Da
morte, que no mar lhe aparelhava
O
vento duro, férvido e medonho,
Como
quem despertou de horrendo sonho. (94, VI)
5)
– Sagradas Escrituras
Deste Deus-Homem, alto e infinito,
Os Livros que tu pedes não trazia,
Que bem posso escusar trazer escrito
Em papel o que na alma andar devia. (66, I)
Outras
lições de Camões neste Quintal:
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