terça-feira, 13 de agosto de 2013

Memorial Pe. Colombo (6)


Os últimos tempos do Pe. Colombo

Estive com o Pe. Colombo em Aveiro, no primeiro ano do Seminário da Boavista, tive-o como conselheiro provincial na primeira administração provincial, voltei agora nestes últimos dois anos e meio a estar com ele na comunidade do Porto-Boavista.
Encontrei-o ainda rijo, mas já vergado pela doença à qual se tinha acostumado tentando enganar a si próprio com um programa de vida regular que ainda era suficientemente forte para uns trabalhos.
Quando o mal atacou (um tumor maligno) em cheio o pulmão esquerdo tudo parecia indicar estar próximo do fim. Mas com a ajuda de Deus (pela Santa Unção que lhe foi administrada), pela perícia dos médicos e pelo carinho dos confrades, das pessoas amigas e das Irmãs da Casa de Saúde da Boavista, conseguiu também desta vez ultrapassar o obstáculo e viver mais dois anos e uns meses discretamente.
A pergunta que muitas vezes me fazia, logo de manhã, era esta: “que trabalho há para fazer?” O seu martírio era ver os outros trabalhar e ele não poder dar uma ajuda conforme a necessidade. Ultimamente, deixávamos os trabalhinhos mais leves para ele os fazer e se entreter como: colar os selos nas catas da secretaria, preparar os envelopes dos aniversários dos Valentes e dos sócios dos grupos missionários, etc… Ajudava na preparação da expedição da Folha dos Valentes, menos nestes últimos dois meses em que já não sentia força nenhuma.
Durante este último ano, à falta de forças, às doenças juntou-se-lhe também uma crise espiritual de inapetência da oração, exemplos sérios por ninharias. Coisa muito estranha num homem de decisões como ele. Só o seu espírito de obediência aos Superiores é que o ajudava a superar os pontos críticos.
A idade não perdoa a ninguém: começou a esquecer-se com uma certa facilidade. A surdez afetava-o e isolava-o terrivelmente, daí a sua curiosidade em remexer tudo aquilo que encontrava à mão para estar a par dos acontecimentos.
A sua presença nas orações comunitárias de laudes, vésperas e Adoração era um estímulo para toda a comunidade. Gostava de concelebrar na Missa paroquial do sábado à tarde e na do domingo às onze horas. Através destas participações saboreava o dia do Senhor. Os cumprimentos das pessoas que o conheciam, depois da Eucaristia, deixavam-no bem-disposto. O chá da Teresinha, prima do Pe. Carrara, que tratava da cozinha na residência paroquial da Boavista, consolava-o.
No início deste ano letivo tinha-me pedido que o levasse à Portelinha quando às quintas-feiras lá fosse para o confesso dos alunos. Regozijava-se em saber que o Seminário Padre Dehon e o Colégio Missionário estavam cheios de alunos.
Sentia uma profunda mágoa quando se apercebia que algum religioso ou alguma comunidade mostrava sinais de tibieza na vivência do nosso carisma e em particular da pobreza. Ele, que tinha passado por tempos de privações, como foram os primeiros tempos de todas as nossas casas e da Província, não conseguia aceitar muitas comodidades que a nossa sociedade de hoje oferece.
Para mim, que lhe fazia um pouco de enfermeiro, tinha uma estima muito grande. Quando faltava em casa por mais de umas horas, parecia que lhe faltava algo…, ficava ansioso. A nossa empregada D. Camila, lidava com ele com muita atenção e carinho, como se fosse o seu pai.
Agora, sentimos o vazio da sua ausência; penso, porém, que temos um grande amigo no céu a pedir a Deus por toda a comunidade.
A sua passagem pelos grupos missionários deixou uma ótima recordação. As zeladoras perguntavam muitas vezes por ele e enviavam-lhe cumprimentos, beijinhos e doces, que com muito gosto colocava ao dispor de toda a comunidade. Quando recebia algum presente entregava-o ao Superior para que dispusesse como achasse melhor, à boa maneira antiga.
Era fidelíssimo ao Sacramento da Penitência. Cada quinze dias ia ao seu confessor, nos Padres Dominicanos. Ultimamente, tinha mudado para o Superior dos Padres do Espírito Santo, que estão mais pertinho…, mas o Senhor chamou-o a si no dia de Páscoa. Quando soube da notícia ficou mal.
Ultimamente dizia-me: “Que estou cá a fazer eu, só estou a atrapalhar a todos”. Mesmo na urgência do Hospital de São João, aonde o acompanhei, num momento de lucidez ainda voltou a manifestar esta sua preocupação: “Estou a fazer-te perder tempo”. Estas foram as últimas palavras que eu ouvi da sua boca, porque depois perdeu a voz e já não se conseguia saber se ainda compreendia ou não.
Na última terça-feira fui visitá-lo, como fazia todos os dias, com o Pe. Carrara e o Pe. João de Deus. Pedi ao Pe. Carrara que levasse o óleo dos enfermos para lhe administrar outra vez o sacramento, o que se fez. Abria os olhos de vez em quando…
Nos dias seguintes sempre o encontrei mergulhado num sono profundo, mas sereno que o levou até à morte.
O Senhor chamou-o para dar-lhe o prémio da vida eterna, como prometeu aos discípulos: “recebereis o cêntuplo aqui com algumas tribulações e… a vida eterna”.
Convido a todos a não esquecê-lo nas orações particulares e comunitárias. Muito lhe devemos.

Pe. António Colombi, SCJ
In UNÂNIMES, nº 4, Junho de 1995, páginas 102-106



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