segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Acerca do patriotismo (I)

 

TERCEIRO DISCURSO 

ACERCA DO PATRIOTISMO CRISTÃO[1]

 
       Senhores,
       É meu propósito dar diante de vós aos nossos alunos, de uma forma mais solene, uma daquelas lições que constituem o fundo do nosso ensino quotidiano.
         Não tememos fazê-lo publicamente. A verdade, a beleza e o bem são feitos para a luz. Temos consciência de cultivá-las. É para nós uma honra mostrá-lo.
         Esta lição tem por tema: O patriotismo recebe da fé o seu mais belo brilho e o seu maior poder.

I
         O que é a pátria?
         Para o comum dos homens, a pátria é o solo que a charrua rasga e que dá ao ceifeiro o grão de que se alimenta; a pátria é a casa que abriga a família, os bosques que adornam o horizonte, o rio que risca a planície, as aldeias semeadas pelos montes vizinhos.
         A pátria é muito mais; ela estende-se até às fronteiras e encerra no seu seio grandes cidades, ricos estabelecimentos industriais, sábias escolas e brilhantes academias. A pátria tem a sua história e as suas gloriosas recordações. Todos os homens amam a pátria: ela dá a felicidade, o prazer, a riqueza.
         Nescio qua natale solum dulcedine cunctos
         Ducit, et immemores non sinit esse sui
                           Ovídio
         Para o cristão, é mais do que isso.
         Para ele o campo traz a bênção de DEUS: o laço da família provém de um sacramento; o lar é um santuário de orações; o templo aí está para unir os cidadãos na caridade. Para o cristão, o solo da pátria foi regado pelo sangue de mártires; contém os monumentos das obras dos seus pais; a sua raça tem junto de DEUS embaixadores que são os seus santos, e a sua história dos feitos bélicos são as lutas da pátria por seu DEUS.
         Não, a fé nunca extingue o amor da pátria; ela ilumina-a e fortifica-a, como cultiva e faz crescer tudo o que é nobre e bom na natureza.
         O homem religioso ama a sua pátria em DEUS. Se ela não tem a verdadeira fé de que ela tem consciência de desfrutar, esforçar-se-á por levá-la pela sua palavra, pelas suas obras, pelas suas orações e pelas suas lágrimas; estará pronto a dar o seu sangue por ela.
         Escutai São Paulo: “É verdade o que vou dizer em Cristo; não minto, pois é a minha consciência que, pelo Espírito Santo, disto me dá testemunho: tenho uma grande tristeza e uma dor contínua no meu coração. Desejaria ser amaldiçoado, ser eu próprio separado de Cristo, pelo bem dos meus irmãos, os da minha raça, segundo a carne. Eles são israelitas, a quem pertencem a adoção filial, a glória, as alianças, a lei, o culto, as promessas; a eles pertencem os patriarcas e é deles que descende CRISTO, segundo a carne, Deus que está acima de todas as coisas, bendito seja Ele pelos séculos”.[2]
         São Paulo dá-nos ao mesmo tempo uma lição e um exemplo de patriotismo.
         A pátria, diz ele, é uma grande família, são os meus irmãos, os meus pais segundo a carne; a pátria judaica para ele, é mais do que isto, é o povo escolhido de DEUS, o povo dos patriarcas, o povo da aliança, da arca santa, dos milagres divinos, das profecias, da promessa e do Redentor, é o povo de DEUS e de CRISTO.
         Eu ouvi o Nubien quase inculto a dizer-me: A pátria, é o Nilo com as palmeiras das suas margens.
         O Romano orgulha-se do seu sangue, que é também um dom de Deus, e da sua fé, que lhe trouxeram os apóstolos; a sua pátria, é, com as suas colinas ricas de tradições, e as ruínas da sua arte antiga que não desdenha, a cátedra e o sepulcro de Pedro, as catacumbas, as basílicas e todos os tesouros sagrados da religião.
         A Polónia não separa do amor das suas planícies e do orgulho da sua raça, a lembrança de Miécislas seu primeiro rei cristão, de Jagellon, do bispo Estanislau, seu glorioso mártir, de Sobieski, o herói de que Deus se serviu para deter a invasão muçulmana.
         Para a Irlanda, a pátria, não são somente as suas húmidas pradarias e as suas montanhas basálticas, é o grande Patrício, seu apóstolo; são os seus velhos mosteiros que fizeram dela a Ilha dos Santos; são os antepassados que lutaram contra a subjugação nacional; é o ardente orador O’Connell que alcançou pela força da sua eloquência a lei da emancipação.

        

 

 

 

 



[1] Discurso pronunciado na distribuição de prémios no Instituto São João, a 2 de agosto de 1879, V. “Semana Religiosa da Diocese de Soissons e Laon”, 6ª Ano, 1878, pp. 487-489, Instituto São João de São Quintino. Foi igualmente publicado na edição especial: Acerca do Patriotismo cristão, São Quintino, Imprensa do Conservador de Aisne, s.d. (1879), pp. 32.
[2] Ep. Rom IX, I

Sem comentários: