Memória de São Teotónio, presbítero, 1082-1162
Teotónio significa
consagrado a Deus
Ou pertença de Deus
O primeiro santo
português
Teotónio nasceu em
Valença, em 1082, tendo sido criado pelo seu tio-avô e Bispo de Coimbra, D.
Crescónio. Formado em Teologia e Filosofia em Coimbra e Viseu, tornar-se-ia
Prior da Sé desta cidade em 1112.
Peregrinou por duas
vezes à Terra Santa. Quando regressou da primeira, foi-lhe oferecido o Bispado
de Viseu, que recusou. Ao voltar da segunda, em 1131, fundou com outros dez
homens de grande virtude o Mosteiro de Santa Cruz, dos Cónegos Regrantes de
Santo Agostinho, em Coimbra, tornando-se o seu primeiro Prior, revelando-se um
membro eminente e muito admirado, nomeadamente por São Bernardo de Claraval.
Em 1153 o Papa
Adriano IV quis fazer de São Teotónio Bispo de Coimbra, seguindo o legado do
seu tio-avô, mas o santo recusou.
São Teotónio é
descrito pelos textos hagiográficos e pelas crónicas de Santa Cruz como um
homem espiritual por excelência: homem de oração intensa, amigo dos pobres e
humildes, austero na vida, conciliador na sociedade e operador de ações
prodigiosas.
No momento da sua morte
de Teotónio foi visto um globo luminoso a descer e a subir sobre o claustro do
Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra.
É por isso que na sua
representação iconográfica consta um globo sobre o livro da regra de Santa Cruz
que segura na mão. Na outra mão tem o báculo de prior ou o bastão de peregrino.
Ainda é costume colocar aos seus pés uma mitra, aludindo a sua múltipla recusa
em aceitar o convite para ser bispo.
Portugal tinha apenas
20 anos quando recebeu a canonização do seu primeiro santo.
Amigo e aliado de D.
Afonso Henriques
São Teotónio foi o
conselheiro e guia espiritual de D. Afonso Henriques. E se um foi o primeiro
rei de Portugal, o outro foi o primeiro santo. Nasceram portucalenses, morreram
portugueses. Poder temporal e poder espiritual, a espada e a cruz.
São Teotónio
assumir-se-ia desde cedo como um fervoroso apoiante da independência
portuguesa, sendo inclusive conselheiro de D. Afonso Henriques. Tido como homem
muito respeitado e de grande valor, terá sido ele a convencer o Rei a libertar
milhares de moçárabes que tinham sido feitos cativos na sequência da guerra de
Reconquista realizada pelas tropas portuguesas.
São Teotónio foi um
importante participante no processo político-religioso que culminaria com o
reconhecimento da independência de Portugal pelo Papa Alexandre III em 1179,
com a bula “Manifestis Probatum”, 17 anos após a morte de Teotónio.
Afonso Henriques e
Teotónio – um santo apoiado por um rei, um rei abençoado por um santo. O que
aconteceu primeiro? Afonso Henriques desejando honrar a memória do pai e
consumar a independência que sonhou para Portucale? Ou a fação mais reformista
da Igreja portucalense que fez dele o seu candidato a rei-fundador de um novo
reino cristão? As duas coisas aconteceram. As vontades pessoais e as políticas.
A espada e a cruz iam andar empunhadas pelas mesmas mãos. Monges e guerreiros lutariam
na mesma guerra, fariam a mesma oração.
Disciplinador de D.
Teresa
Enfrentou D. Teresa,
mãe de Afonso Henriques, pois D. Henrique de Borgonha morreu precocemente aos
46 anos, deixando viúva a mulher de 32 anos. A sua relação com Fernão Peres de
Trava, fidalgo galego, aproximava Portucale com a Galiza. Outro irmão Bermudo mantinha
também relação com Teresa. Era pecado ser mulher de dois irmãos. Teotónio
corrigia-a.
Estando D. Teresa por
Viseu mandou dizer a Teotónio que tinha pressa e que se despachasse a celebrar
a missa. Em resposta, o prior fez saber que havia no céu rainha muito mais
importante do que ela e que, em sua honra a missa seria celebrada com toda a
reverência e bem devagar. Dessa vez Teresa deu-se por culpada: assistiu
serenamente à eucaristia e, no final, em privado, ajoelhou-se aos pés de
Teotónio, chorando pedindo-lhe que rogasse por ela a Deus.
Outro vez apareceu
Teresa na Sé de Viseu para assistir à missa na companhia de Fernão com quem não
era casada. O prior dedicou-lhes o sermão, um discurso cruel, sem nomes, acerca
daqueles que viviam mal casados. Teresa e Fernão resistiram alguns minutos, mas
depois entreolharam-se, levantaram-se e abandonaram a igreja por entre uma
multidão que não sabia se deveria desviar respeitosamente o olhar ou aplaudir.
Não temia dizer a
verdade aos poderosos para que estes temessem e seguissem a verdade.
Nunca deixou de ser
cidadão só por ser padre, nem deixou de ser padre para ser cidadão.
À margem 1:
No Canto VIII,
estância 19 de Os Lusíadas, Camões escreveu sobre São Teotónio:
Um Sacerdote vê, brandindo a espada
Contra Arronches, que toma, por
vingança
De Leiria, que de antes foi tomada
Por quem por Mafamede enresta a lança:
É Teotónio Prior. Mas vê cercada
Santarém. E verás a segurança
Da figura nos muros que, primeira
Subindo, ergueu das Quinas a bandeira.
À margem 2:
Também Fernando
Pessoa, no seu livro Mensagem, alude a São Teotónio, ao apresentar D. Afonso
Henriques. Os dois formam uma aliança perfeita – um representa a bênção e o
outro a espada.
D. Afonso Henriques
Pai, foste cavaleiro.
Hoje a vigília é
nossa.
Dá-nos o exemplo
inteiro
E a tua inteira
força!
Dá, contra a hora em
que, errada,
Novos infiéis vençam,
A bênção como espada,
A espada como bênção!
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