Foram devastadoras as consequências que a I Guerra
Mundial infligiu à Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos),
aos seus membros e às suas obras e projetos. O impacto foi maior nesta
congregação pois nascera e tinha os seus principais recursos na zona central
das operações desta guerra.
O recrutamento vocacional e a formação demorariam mais
de 10 anos a recuperar-se deste impacto.
Dos 70 professos que foram recrutados em ambos os
lados do conflito, quase metade morreria.
De facto durante todo o conflito bélico morreram 33
dehonianos ao serviço dos exércitos:
23 da Província Alemã e 10 da Província Francesa.
Destes 5 eram noviços, 18 escolásticos e 10 irmãos cooperadores.
Os padres estavam dispensados do porte de armas e por
isso não eram colocados na frente de batalha.
Os mais novos (noviços e escolásticos) faziam parte
dos batalhões regulares enquanto os irmãos serviam como enfermeiros.
De entre os falecidos, os mais novos foram os noviços
de 20 anos e os mais velhos os irmãos cooperadores de 37 ou 38 anos.
Durante os anos da guerra, foram muitas as cartas com
as quais o Pe. Dehon procurou manter-se em contacto com os seus confrades que
estavam em frente de batalha, sobretudo para os confortar com o apoio
espiritual, moral e humano.
Apresentamos dois exemplos, precisamente dos dois que
estão na foto ao lado do Pe. Dehon no jardim da Casa do Coração de Jesus em São
Quintino logo no início da guerra.
1º - Alfred Rottaire, na foto já fardado.
Tinha feito os primeiros votos a 22 de setembro de 1906.
A 17 de junho de 1915 morreu aos 27 anos, em Neuville
St. Vaast, França.
Ao amanhecer desse dia tinha escrito esta breve carta
aos seus pais:
Papá e mamã,
O dia promete ser quente.
Alguns dos nossos perderão hoje as suas vidas.
Se eu estiver no número destes homens mortos, não se
lementem nem me chorem demasiado…
Espero reencontrar o meu irmão Honoré, morto também
pela França.
Lá em cima nos reuniremos sem lágrimas…
Vosso filho que vos ama mais do que nunca
Alfred
2º - Paul Crépin, na foto ainda de batina
Antigo aluno de São João e de São Clemente de Fayet
era natural de São Quintino. Fez os primeiros votos a 23 de setembro de 1910.
Faleceu com 25 anos no dia 28 de junho de 1918, aos 5 meses antes do
armistício.
Esta carta é dos começos de 1918, dirigida ao Pe.
Dehon:
Reverendíssimo Padre…
A sua carta de janeiro, dando-se a sua direção,
permite-me dar-lhe agora algumas notícias. Gostaria de tê-lo feito há mais
tempo, mas no exército nem sempre se faz o que se quer.
Aqui não encontramos nenhuma trincheira, mas
unicamente algumas covas de obuses cheios de água. À nossa volta só há
devastação. Não há mais de dois metros que não tenha sido destroçado, cheios de
cadáveres já em decomposição que sinto o dever de enterrar. Não longe de nós…
os alemães.
Tudo isto me faz refletir. Vossa reverência já não
conheceria o jovem tímido de outrora. A guerra mudou-me muito até me fazer o
homem de hoje: cada coisa a seu tempo. Por agora é a guerra… Sinto tal aversão
aos alemães que não os posso ver à minha frente nem pintados… Estou orgulhoso
de ter sido chamado, embora não quisesse, para inculcar os meus sentimentos a
algumas dezenas de camaradas.
A guerra também me fez conhecer a vida e o que a vida
é na presença da morte.
Fora destes poucos momentos de meditação, esqueço tudo
para alegrar um pouco os meus camaradas. É um belo apostolado depois de mais de
três anos de guerra. Pode estar seguro que tenho cumprido o meu dever.
Com pena me despeço, pois o serviço chama por mim.
Quando voltarei a vê-lo?!
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