sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Dehonianos na Guerra


Foram devastadoras as consequências que a I Guerra Mundial infligiu à Congregação dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos), aos seus membros e às suas obras e projetos. O impacto foi maior nesta congregação pois nascera e tinha os seus principais recursos na zona central das operações desta guerra.
O recrutamento vocacional e a formação demorariam mais de 10 anos a recuperar-se deste impacto.
Dos 70 professos que foram recrutados em ambos os lados do conflito, quase metade morreria.
De facto durante todo o conflito bélico morreram 33 dehonianos ao serviço dos exércitos:
23 da Província Alemã e 10 da Província Francesa.
Destes 5 eram noviços, 18 escolásticos e 10 irmãos cooperadores.
Os padres estavam dispensados do porte de armas e por isso não eram colocados na frente de batalha.
Os mais novos (noviços e escolásticos) faziam parte dos batalhões regulares enquanto os irmãos serviam como enfermeiros.
De entre os falecidos, os mais novos foram os noviços de 20 anos e os mais velhos os irmãos cooperadores de 37 ou 38 anos.















Durante os anos da guerra, foram muitas as cartas com as quais o Pe. Dehon procurou manter-se em contacto com os seus confrades que estavam em frente de batalha, sobretudo para os confortar com o apoio espiritual, moral e humano.
Apresentamos dois exemplos, precisamente dos dois que estão na foto ao lado do Pe. Dehon no jardim da Casa do Coração de Jesus em São Quintino logo no início da guerra.

1º - Alfred Rottaire, na foto já fardado.
Tinha feito os primeiros votos a 22 de setembro de 1906.
A 17 de junho de 1915 morreu aos 27 anos, em Neuville St. Vaast, França.
Ao amanhecer desse dia tinha escrito esta breve carta aos seus pais:

Papá e mamã,
O dia promete ser quente.
Alguns dos nossos perderão hoje as suas vidas.
Se eu estiver no número destes homens mortos, não se lementem nem me chorem demasiado…
Espero reencontrar o meu irmão Honoré, morto também pela França.
Lá em cima nos reuniremos sem lágrimas…
Vosso filho que vos ama mais do que nunca
Alfred

2º - Paul Crépin, na foto ainda de batina
Antigo aluno de São João e de São Clemente de Fayet era natural de São Quintino. Fez os primeiros votos a 23 de setembro de 1910. Faleceu com 25 anos no dia 28 de junho de 1918, aos 5 meses antes do armistício.
Esta carta é dos começos de 1918, dirigida ao Pe. Dehon:

Reverendíssimo Padre…
A sua carta de janeiro, dando-se a sua direção, permite-me dar-lhe agora algumas notícias. Gostaria de tê-lo feito há mais tempo, mas no exército nem sempre se faz o que se quer.
Aqui não encontramos nenhuma trincheira, mas unicamente algumas covas de obuses cheios de água. À nossa volta só há devastação. Não há mais de dois metros que não tenha sido destroçado, cheios de cadáveres já em decomposição que sinto o dever de enterrar. Não longe de nós… os alemães.
Tudo isto me faz refletir. Vossa reverência já não conheceria o jovem tímido de outrora. A guerra mudou-me muito até me fazer o homem de hoje: cada coisa a seu tempo. Por agora é a guerra… Sinto tal aversão aos alemães que não os posso ver à minha frente nem pintados… Estou orgulhoso de ter sido chamado, embora não quisesse, para inculcar os meus sentimentos a algumas dezenas de camaradas.
A guerra também me fez conhecer a vida e o que a vida é na presença da morte.
Fora destes poucos momentos de meditação, esqueço tudo para alegrar um pouco os meus camaradas. É um belo apostolado depois de mais de três anos de guerra. Pode estar seguro que tenho cumprido o meu dever.
Com pena me despeço, pois o serviço chama por mim.
Quando voltarei a vê-lo?!


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