O
Pe. Dehon viveu no centro do cenário da I Guerra Mundial. Como é seu costume,
nunca deixou de registar, quase diariamente, as suas vivências pessoais bem
como o que se passava à sua volta. 
Diário de agosto de
1914
No
dia 2 foi ordenada a mobilização geral. São os dias maus de 1870 que regressam.
A guerra de então chegava depois do Concílio, esta chega depois do Congresso
Lourdes. Quais são os desígnios da Providência? A minha Congregação é dizimada:
trinta e cinco dos meus franceses e outro tanto dos alemães são mobilizados. 
Depois
do Concílio, Deus permitiu a guerra para evitar um cisma. Não é este o mesmo
caso? 
Nossa
Senhora de Lourdes vai tirar proveito da guerra para renovar a Europa e a França.
Os
oficiais franceses são geralmente religiosos, isso deve-se aos colégios
jesuítas e outros colégios da igreja. Nesta guerra existem dois fatores
sobrenaturais que o mundo ignora: Nossa Senhora de Lourdes e a Companhia de
Jesus. 
Primeiras
proezas das armas: resistência de Liège e tomada Mulhouse. Tomada de várias
passagens em Vosges. 
A
Rússia promete autonomia à Polônia, é um grande fato histórico. É um grande
reino católico que se erguerá. 
Este
é um momento de ansiedade para mim. Medo pela família, pelo país, pela
Congregação. Tenho muitos dos meus filhos espirituais na guerra! Faltam os
recursos. Os benfeitores reservam-se. É preciso uma confiança cega na
Providência. 
No
dia 21 envio os meus jovens italianos para Bolonha. O noviciado está deveras
prejudicado, há angústias por todos os lados. 
Pio
X morreu. Ele era nosso amigo, nosso benfeitor. Ele deu-nos a aprovação. Era um
santo. Rezo por ele e invoco-o. Como era bom, simples e familiar, quando ia
vê-lo! Ele não permitirá que São Pedro me receba mal lá no céu. 
A guerra: angústias 
Bruxelas
está ocupada. As minhas angústias aumentam. O que acontecerá às minhas casas de
Lovaina e de Ixelles? 
O
Pe. Wernz também morreu. Eu conhecia-o bem. Tenho no céu uma legião de amigos.
Possam eles alcançar a minha conversão! 
No
dia 25 aos combates aproximam-se de nós. O perigo começa. Ofereço a minha vida
pelo reino do Coração de Jesus, pela minha obra, pela Igreja: que Nosso Senhor
me perdoe todas as minhas tão numerosas faltas. Eu amo-o assim mesmo e acima de
tudo. 
Dias
de angústia. Ofereço a Deus todas as reparações de Nosso Senhor e dos santos.
Os nossos sofrimentos quotidianos juntam-se aos méritos infinitos do Salvador. 
Dia
27. Ouvimos os canhões durante todo o dia. A cidade está desorganizada: sem
comboios, sem correio. É o pânico. Os Ingleses acompanham-nos com a sua
compostura e confiança. A região vizinha está devastada. Caudry, Catry,
Estrées, etc. etc, tudo está queimado e bombardeado. A população fugiu
perturbada. O Pároco de Maissemy traz-nos o seu cibório cheio hóstias sagradas.
A ocupação 
Dia
28. Santo Agostinho. Ouve-se o ruído dos canhões. Depois os tiros crepitam,
sentimos o pó. Fiat! 
Todas
as nossas casas estão muito afetadas. Luxemburgo, Louvaina, Bruxelas, Mons,
Quévy, por todo o lado a invasão e a guerra. Esta é precisamente a nossa missão
reparadora. 
Eu
leio a vida de Mary Brotel, uma vítima e alma reparadora. Inspiro-me nos seus
sentimentos. 
É
o aniversário da morte da Irmã Maria de Jesus, vítima de amor e de reparação.
Conto bastante com suas orações. Trago o relicário de Santo André usado pelo
Padre André, ele protege-me. 
À
noite a cidade é invadida, após dois dias de violentos combates. Deixemos que Nosso
Senhor cumpra os Seus desígnios sobre as nações... 
Dia
29. A ocupação da cidade é bastante tranquila. Os canhões rugem ao longe, a
batalha continua a alguns quilómetros daqui. 
Estes
canhões que retumbam como a tempestade são assustadores, eles provocam terror.
Quantas vidas são ceifadas nestes dias! Ofereço sem cessar as expiações e os
méritos de Nosso Senhor e dos santos pelos que morrem e pelos que morreram.
Repito os três nomes abençoados de Jesus, Maria, José. 
A
batalha situa-se agora a leste de São Quintino, no lado de La Fère. Os canhões
retumbam mais fortes ainda que nos dias anteriores. 
Invoco
São João Batista cuja decapitação comemoramos. É um grande protetor da Igreja.
Ele nos ajudará. 
Há
horas terríveis quando o tiroteio é tão violento que o sistema nervoso fica
todo abalado. Foi-nos ordenado alojamento para os soldados inimigos, no entanto
não vieram. O Coração de Jesus protege realmente a sua casa. 
Dia
30. Domingo cinzento. Ninguém se atreve a sair das suas casas, os sinos
calam-se. Há pouca gente nas igrejas. E, no entanto, é preciso rezar muito,
orar sem cessar. Para a cristandade é um período tão grave! 
Durante
todo o dia os canhões rugem ainda, pelo menos até às 3 horas. Este é o 4º dia
de batalha. Muitos feridos chegam à cidade. 
Dia
31. Hoje será aberto o Conclave. Nós não sabemos nada sobre as coisas do
exterior. 
Dia
de relativa calma: movimentos de tropas. Não se ouve a artilharia. 
A
batalha foi muito violenta durante quatro dias, especialmente no sábado. Hoje
removem-se os mortos e os feridos, que são muitos. À noite temos de alojar três
médicos oficiais alemães. Eles são católicos e bem-educados. 
À
noite os soldados aparecem para roubar, mas nossos oficiais metem-nos em ordem.
 
