Festa da Transfiguração do Senhor
A montanha
O Evangelho afirma que a Transfiguração ocorre em um
"alto monte" (Mc 9,2; Mt 17,1). Dessa forma, conecta-a com dois
importantes eventos bíblicos, que também ocorreram no topo de uma montanha: a
aliança que Deus estabeleceu com Israel no Monte Sinai, no tempo de Moisés, e a
revelação de que há um só Deus verdadeiro, que Ele fez no Monte Carmelo, no
tempo de Elias. De fato, ambos estão presentes na Transfiguração, para dar
testemunho de Cristo, que realiza o que eles começaram. Mais tarde, a morte e a
ascensão de Jesus ao céu também ocorrem em duas montanhas: o Calvário e o Monte
das Oliveiras.
Os Evangelhos não mencionam o nome da montanha, mas a
tradição a identificou com Tabor, na Baixa Galileia, perto do Lago Genesaré.
A subida à montanha refere-se ao esforço daqueles que
seguem Jesus. A maioria permaneceu no vale. São Jerônimo enfatiza que somente
aqueles que subiram à montanha viram Jesus transfigurado. Assim, os cristãos
devem caminhar com Cristo para contemplá-lo: Jesus não se transfigura enquanto
está cá em baixo: ele sobe e então se transfigura. “E os conduziu a um alto
monte, à parte, e foi transfigurado diante deles.” Ainda hoje, para alguns, ele
está em baixo e para outros, em cima. Aqueles que estão em baixo também têm
Jesus em baixo, e são as multidões que não podem subir a montanha — somente os
discípulos sobem a montanha; as multidões permanecem em baixo. Portanto, se
alguém está em baixo e pertence à multidão, não pode ver Jesus com vestes
brancas, mas sim com vestes imundas. Se alguém segue a letra e está
completamente em baixo e olha para a terra como um animal irracional, não pode
ver Jesus com suas vestes brancas. No entanto, quem segue a palavra de Deus e
sobe a montanha, isto é, ao mais alto, para essa pessoa Jesus é transfigurado
instantaneamente, e suas vestes se tornam muito brancas.
A nuvem
A nuvem simboliza a presença de Deus. Durante o Êxodo,
no deserto, Deus se fez presente por meio de uma nuvem que guiou o povo e,
quando acamparam, "desceu" sobre a Tenda do Encontro,
"cobrindo-a" com sua sombra (cf. Ex 24:15-18). Isaías a identifica
com o Espírito Santo (cf. Is 63:14).
Essa mesma nuvem "desceu" sobre Maria e a
"cobriu com a sua sombra", tornando-a fecunda (cf. Lc 1,35). Agora,
ela "desce" sobre Jesus e o "cobre com a sua sombra" (cf.
Mc 9,7), indicando que Deus está presente, cumprindo todas as suas intervenções
salvíficas anteriores. O uso dos mesmos verbos nos três textos é significativo.
A voz
Assim como aconteceu no Batismo, na Transfiguração
Jesus ora com o desejo de se submeter à vontade do Pai, o que coincide com a
obediência e o sofrimento do Messias. Em resposta, sinais de Sua aprovação
vieram do céu: a luz que transfigurou Cristo e a voz que o proclamou
"Filho amado", acrescentando o convite a ouvi-lo, pois ele é o
profeta definitivo.
(Inspirado numa reflexão do Pe. Eduardo Sanz de
Miguel, Carmelita Descalço)
À margem
Os cinco dedos que apontam para a Transfiguração ou que
a Transfiguração aponta para nós.
1º dedo – Da unidade à Trindade
São Tomás de Aquino comenta que na Transfiguração
“apareceu toda a Trindade: o Pai na voz, o Filho no homem, o Espírito na nuvem
luminosa”. A liturgia de hoje, porém, sublinha que a Transfiguração é como um
grande ápice da pregação de Cristo. O Pai fala, o Filho é a Palavra, o Espírito
é a luz ou a nuvem.
2º dedo – Do monte das tentações ao monte da
Transfiguração
É também a contrapartida das tentações que Ele sofreu
no deserto. No deserto, o Diabo O tentou; aqui, na Transfiguração, dois santos
O acompanham. Lá, Satanás citou a Lei e os Profetas para tentá-Lo; aqui, os
representantes mais importantes da Lei e dos Profetas aparecem ao Seu lado para
apoiá-Lo. Lá, Ele estava faminto e humilhado; aqui, Ele aparece cheio de glória
e poder. Lá, Ele mostrou que era um verdadeiro homem; aqui, Ele mostra que é
verdadeiro Deus.
3º dedo – Da terra ao Céu
Cristo foi transfigurado para dar aos Seus discípulos
– e a nós – um vislumbre da glória do Céu, para que eles não tivessem medo de
partir para lá e não quisessem mais sair de lá.
4º dedo – Da Paixão à Ressurreição
Não se pode ter verdadeira fé sem lembrar tanto a
Paixão quanto a Glória de Cristo: que Ele é Homem e Deus. É importante notar
que esses mesmos Apóstolos – Pedro, Tiago e João – também foram escolhidos por
Cristo para testemunhar Sua Paixão no Jardim das Oliveiras, bem como a
ressurreição da filha de Jairo. Cristo ensinou o valor de Seu sacrifício
voluntário, aceitando o “cálice” e deixando-se “espremer como uma azeitona” (Getsémani
= prensa de azeite), mas também nos disse para “não temermos”, pois Ele tem o
poder de vencer a morte (a ressurreição da menina) porque Ele é Deus. Os Apóstolos
compreenderiam completamente o dom da Transfiguração somente depois de beberem
do cálice dos sofrimentos de Nosso Senhor. Devemos lembrar que esta é
precisamente a promessa de Nosso Divino Salvador a São Tiago e São João, quando
lhes disse: "Bebereis o cálice do qual eu bebo". Implícita nesta
advertência de Cristo não está simplesmente a participação em Sua morte, mas
também nos sofrimentos interiores que eles teriam que suportar por amor ao Seu
Nome.
5º - Da Transfiguração à Eucaristia
Uma lembrança da Transfiguração de Nosso Senhor Jesus
Cristo aos três Apóstolos, Pedro, Tiago e João, pode ser encontrada na Missa,
quando Jesus é levantado pelo sacerdote para que todos O adorem, como foi o
caso dos Apóstolos, que se curvaram diante da Divindade. De fato, assim como
Moisés e Elias testemunharam a divindade de Cristo no Monte Tabor, também os
anjos, embora invisíveis, estão presentes em cada Consagração do pão e do vinho
no Corpo e Sangue de Nosso Senhor. É verdade que os tipos de milagres são
diferentes. No primeiro, a admiração surge muito mais naturalmente, dada a
mudança na aparência de Jesus, sem mencionar a presença das duas figuras do
Antigo Testamento. No entanto, o segundo milagre é mais significativo porque
substâncias comuns são transformadas no próprio Deus. A transfiguração é a
prefiguração ou pré-anúncio do mistério da Eucaristia.
Ver também:
Sacrificar, testemunhar e transfigurar
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